Marcio era um executivo bem sucedido. Tinha uma grande casa, uma bela esposa e duas adoráveis crianças. Ele era diretor de uma grande empresa, que ficava a apenas dois quarteirões de sua casa. Isso o ajudava muito, pois não precisava de carro para chegar ao escritório. Bastava andar em linha reta até a porta da empresa. Apesar de ser extremamente egoísta, Marcio se considerava religioso.
Como havia uma igreja no caminho rotineiro de seu trabalho, ele costumava fazer um sinal da cruz quando passava pela igreja. Essa igreja sempre estava aberta. De manhã, com alguns fiéis na porta e pouca claridade e a noite, quando Marcio retornava para casa e conseguia ver o padre de costas rezando sua missa rotineira. A vida desse executivo era regada a muito dinheiro. Sempre em festas sociais, eventos e desfiles glamourosos. Quanto mais dinheiro ele conseguisse melhor pois ele ficaria mais rico ainda. Até que um dia, o destino bateu em sua porta. Antes de sair para o trabalho, um mendigo tocou a campainha de sua casa. Marcio pediu para a empregada ver o que ele queria. Ela disse que ele gostaria de falar com o Sr. Marcio.
- Mas como esse velho sabe o meu nome? Indagou Marcio perplexo.
Chegando ao portão, Marcio encontrou um velho, careca e com barbas longas e grisalhas. Sujo e com roupas rasgadas. O velho quase se arrastava pelo chão, lhe suplicando:
- Por favor. Dê me um real. Deus lhe agradecerá em dobro.
- Fora daqui ! - Gritou Marcio - Que falta de respeito é esse com pessoas honestas e trabalhadoras? Saia já de frente da minha casa ou eu chamarei meus seguranças !
O velho saiu da frente de sua casa se arrastando. Parecia estar machucado ou com muita fome. Mas isso não comoveu Marcio, que com um beijo despediu-se de sua esposa e foi trabalhar. Foi trabalhar pelo mesmo caminho. Passou pela igreja, fez um sinal da cruz e continuou sua caminhada. Nem sequer lembrara do pobre mendigo. Depois de mais um longo dia de trabalho, Marcio volta para casa, pelo mesmo caminho de sempre. Passa pela igreja, vê o vulto do padre rezando a missa e entra em sua casa. No dia seguinte, no mesmo horário, o mendigo aparece novamente na porta da casa de Márcio:
- Por favor. Dê me um real. Deus lhe agradecerá em dobro.
- Mendigo insolente, vou chamar a polícia.
- Eu só preciso de um real para comprar comida. Por favor, Deus lhe agradecerá e dobro.
Enquanto Marcio discutia com o mendigo, sua esposa tinha ido buscar alguns pães para dar ao mendigo. Marcio, irritadíssimo com o velho e pela atitude de sua esposa, tomou-lhe o pão e o pisoteou. Depois carregou o saco para dentro de casa dando gargalhadas. Ao voltar para o portão, para ir trabalhar, o mendigo não estava mais lá. E mais um dia se passou na vida de Marcio. E foi assim por uma semana. O mendigo tocava a campainha na mesma hora da manhã pedindo dinheiro, e Marcio a cada dia humilhava mais o pobre coitado. Mas, em um certo dia, o mendigo não apareceu. Marcio dava graças a Deus que aquele monte de lixo havia percebido que não conseguiria nada e fora embora. O grande executivo toma seu caminho para o trabalho calmamente, assobiando de felicidade. Ao passar na porta da igreja, Marcio resolveu parar em frente e "agradecer".
- Obrigado Deus, por tirar aquele homem da minha casa.
E seguiu seu caminho para o trabalho. O dia de Márcio segue tranqüilamente. Até o momento que ele passa pela igreja. Marcio vê um movimento estranho na porta do templo. O padre não está rezando a missa hoje. O que haveria acontecido? Marcio resolve entrar para ver o que acontecia e pergunta a uma das fiéis, que chorava desesperadamente:
- O que aconteceu? - O padre Gabriel morreu - Responde a jovem emocionada.
- Mas morreu como?
- Ele havia feito uma promessa a Deus. Queria mostrar que ainda havia pessoas boas nesse mundo e fez jejum por uma semana, para sobreviver com a caridade das pessoas. Morreu de anemia hoje de manhã.
- Que triste - exclama Márcio - Vou fazer uma homenagem visitando o corpo.
Mas, ao chegar ao lado do defunto, Márcio leva um choque, ao perceber que aquele velho deitado no caixão era a mesma pessoa que lhe pedira dinheiro por uma semana, para comprar comida. Marcio fica aterrorizado com a visão daquele pobre velho, agora limpo, de batina e de olhos fechados, sem dizer uma palavra. Marcio fica tonto, sua visão começa a ficar distorcida e ele ouve incessantemente a frase que o Padre lhe falou durante uma semana: - Por favor. Dê me um real. Deus lhe agradecerá em dobro. - Por favor. Dê me um real. Deus lhe agradecerá em dobro. - Por favor. Dê me um real. Deus lhe agradecerá em dobro. Ele não sabe o que fazer, Márcio olha para os lados e vê todas as pessoas a sua volta. Todos olhando para ele, com a fisionomia do velho. Com a barba branca e careca e olhares que pareciam lhe perfurar o coração. O executivo não sabe o que fazer, e num gesto de desespero sai correndo em direção à rua. Mas não percebe a chegada de um caminhão em alta velocidade que lhe acerta em cheio. Marcio cai no chão ensangüentado, cheio de fraturas no corpo, até que dê seu último suspiro.
Márcio acorda, em um lugar claro, cheio de luzes brancas e amarelas. Uma paz absoluta. Ele vê uma pessoa vindo em sua direção. Uma pessoa vestida de branco. As luzes atrapalham a visão e Marcio não consegue reconhecer quem é. Ao tocar na mão da pessoa, Marcio percebe as rugas, e ao olhar para cima vê o rosto do velho, com um semblante triste no rosto.
- Infelizmente, meu irmão, você não conseguiu salvar sua alma.
- Como assim? Indaga Márcio
- Deus havia lhe dado à chance de lhe salvar. Mandou-me interferir em sua vida para que deixasse de ser egoísta. Mas agora é muito tarde.
- Mas o que vai acontecer comigo? Antes mesmo de Marcio terminar sua pergunta, dezenas de mãos negras, todas deformadas e queimadas surgem do solo. Todas elas puxando a perna de Marcio. Para não deixar ele escapar, as mãos em decomposição cravavam suas unhas na carne de Marcio. Ele estava sendo puxado para o inferno, onde seria torturado, queimado e ficaria apodrecendo pelo resto de sua vida. Marcio tenta as últimas palavras para que o velho lhe ajudasse, mas a resposta é a confirmação de sua sentença de morte eterna.
- Desculpe, senhor... mas eu não tenho um real...
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